Não, não estamos falando daquele papo repetitivo da substituição do CD físico pelo arquivo digital (embora essa substituição seja real). Estamos falando do CD completo, como conhecemos hoje, com 16 ou 20 músicas. Este parece estar fadado a um fim.
Você se lembra do primeiro LP ou CD que você comprou? Pois é bem provável que seu neto não tenha essa memória. Depois das lojas de discos, tudo indica que outro animal sagrado do ecossistema fonográfico está em vias de entrar em extinção: o álbum.
Claro, não vai ser hoje. Mas a tendência é de que o velho disco, a coleção de faixas que conversam entre si e com o projeto gráfico, muitas vezes reflexo do momento musical e pessoal da banda, se torne artigo de colecionador. O formato, que já passou dos 60 anos, parece não se encaixar nos novos hábitos de consumo de música, que privilegiam, entre outros pontos, qualidade à quantidade.
“Uma faixa incrível é melhor do que dez faixas medianas”, crava Mick Wall, jornalista, crítico e autor de biografias de Black Sabbath, AC/DC e Metallica. “Além disso, o que é um álbum na era digital? O formato físico já não existe mais, não temos lado A e lado B. Então, por que a música precisa continuar a ser vendida dessa forma?”
É nisso que estão pensando artistas de renome, como os Rolling Stones. Em meados de 2013, Mick Jagger afirmou que até gostaria de gravar um novo disco de inéditas, mas sabe que não é isso que seu público deseja – por isso, desde 2005, só lançaram duas faixas inéditas, em formato de single.
Vendas abaixo do esperado do seu trabalho mais recente motivaram o Aerosmith a repensar a vida. Em entrevista à revista Rolling Stone norte-americana, o guitarrista Joe Perry disse que é provável que a banda nunca mais lance álbuns e se concentre apenas em EPs – formato que comporta menos faixas e vem se consolidando nas listas de mais vendidos.
O que se nota também, é o crescimento dos EPs como forma de trabalho de novos artistas. Ou mesmo de artistas que já têm um tempo de estrada mas ainda não se estabeleceram num mainstream. É o caso do Ludov, banda com 10 anos de carreira que começou com o lançamento de um EP e teve em três dos seus quatro últimos lançamentos o formato de EP com apenas quatro músicas: somente depois de lançar EPs em 2011, 2012 e 2013 a banda lançou um disco completo este ano, Miragem, em formato LP para colecionadores e digital.
Semelhante foi o caso da curitibana Colorphonic: em 2010 a banda lançou seu primeiro trabalho, um EP de apenas quatro músicas. Três anos depois um novo disco, agora chamado de “álbum” e não de EP, mas ainda assim com apenas seis músicas. Para o guitarrista da banda, Luciano G.L. Costa, a mudança é positiva: “acho que a tendência de produção de EPs, ao invés de LPs, pode ser bastante positiva. No nosso caso, quisemos concentrar as músicas que acreditávamos mais bacanas sem ter que “encher linguiça” pra fazer um registro onde nem todas músicas poderiam apresentar nosso potencial. Outro lado bom do EP é que um artista pode apresentar novidades mais rapidamente e manter a atenção na banda por mais tempo. Além disso, numa época onde as pessoas não têm paciência nem para prestar atenção em um comercial de 5 segundos no Youtube, fazer trabalhos cada vez mais enxutos acaba sendo a única saída.”.
Pop
Gente da música pop também não se sente mais motivada a entrar em estúdio e registrar uma dúzia de faixas para depois empacotá-las em CD ou LP. Will.i.am, cérebro do Black Eyed Peas e produtor do primeiro time dos astros da música pop mundial, acredita que o álbum está definitivamente ultrapassado.
“Um álbum de 16 canções? Eu prefiro gravar 45 vídeos no Vine e prestar atenção em seis segundos”, disse, em entrevista ao site Big Top 40, em junho, durante o lançamento de seu single Birthday.
Os números provam que Will.i.am está parcialmente correto. Segundo o último relatório da International Federation of the Phonographic Industry (IFPI), organização que representa as grandes gravadoras do planeta, o comércio de discos físicos continua em queda, mas ainda corresponde a mais da metade das vendas. Entretanto, serviços de streaming (como Spotify e Deezer) e de música digital, que possibilitam a compra e a audição de faixas individuais, não param de crescer – e representam hoje 39% do consumo musical em todo o mundo.
“As pessoas amam música mais do que nunca”, comenta Mick Wall. “Novos e velhos artistas devem fazer grandes canções e colocar nos serviços de streaming. Se as pessoas gostarem, virão correndo. Simples assim.”
No Brasil
O EP está com com tudo no Brasil. Segundo relatório da Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD), da lista de discos físicos mais vendidos em 2013, os três primeiros foram EPs. Os compactos ficaram à frente de trabalhos no formato tradicional de grandes vendedores, como Luan Santana, One Direction e Anitta.
A cantora Paula Fernandes foi uma das que emplacaram um trabalho neste formato. Seu EP Um Ser Amor ficou em terceiro lugar, atrás dos EPs de Padre Marcelo Rossi e Roberto Carlos. Para ela, o CD com três ou quatro faixas é útil para atingir um número maior de pessoas – já que é mais barato – e trabalhar melhor as músicas. Mas não substitui um álbum completo.
O fato é que perdemos o costume de ouvir um disco do início ao fim como fazíamos anos atrás. Hoje queremos somente “aquela música”. E um CD com 16 faixas já não ocupa tanto espaço em nosso tempo cada vez mais urgente e corrido.
Com informações da Gazeta do Povo


Deixe um comentário