Resenha do blog: O Grande Gatsby

Todos os filmes do diretor australiano Baz Luhrmann possuem um denominador comum. Não estou falando de sua estética particular, ou de sua preocupação com a trilha sonora, mas de um em destaque, um que se mostra mais presente que qualquer outro: o amor impossível. Desde seu primeiro longa essa característica está presente, e segue em todos os outros: o amor de uma empregada por um bailarino (Vem Dançar Comigo – de 1992); o de dois adolescentes filhos de famílias rivais (Romeu + Julieta – 1996); o de uma cortesã prometida para um rico conde por um poeta pobre (Moulin Rouge – 2001); o de uma fazendeira por seu capataz em meio a uma guerra civil (Austrália – 2008). E claro, seu filme mais recente não poderia ser de outra forma: o amor de um playboy rico por uma mulher casada com um empresário igualmente rico em O Grande Gatsby. Sim, Gatsby é, acima de tudo, uma história de amor. Ou várias…
Para quem não é familiar com o livro, O Grande Gatsby é o aclamado romance de F. Scott Fitzgerald, publicado pela primeira vez em 1925 e adaptado para o cinema cinco vezes, em 1926, 1949, 1974 e 2000 (filme para TV) antes desta e figura entre as melhores obras literárias do século XX. O livro é tido como uma grande crítica ao “sonho americano”, ao vazio das vidas de luxo, festas e bebidas da década de 1920 após a primeira guerra mundial. Mas não é bem essa a ideia da nova adaptação. A crítica está ali sim, implícita, mas se você não prestar atenção pode não perceber que também está sendo criticado, em meio a tudo que acontece na tela.
Durante os primeiros quarenta minutos de filme tudo o que fazemos é ouvir os feitos e maravilhas deste estranho protagonista. Seus atos heróicos, suas festas homéricas, tudo sem que ele apareça em cena. Mesmo assim ele está ali, onipresente. Seu nome é dito e repetido incessantemente, um ar de mistério paira no ar. Quando o sorriso e os olhos azuis de Leonardo DiCaprio finalmente iluminam a tela sob a personalidade de Jay Gatsby, já estamos tão apaixonados e encantados por ele quanto qualquer um dos outros personagens. Em especial Nick Carraway (Tobey Maguire), o narrador da história.
A versão de Baz Luhrmann para um dos livros mais lidos dos Estados Unidos é mais que um filme. Ultrapassa as barreiras da tela em uma fotografia fantástica em 3D. Como o próprio narrador, nos sentimos o tempo todo dentro e fora daquele mundo, participantes e espectadores daquela história. Ao retratar o vazio daquela burguesia aparentemente sem objetivos, Luhrmann cria um sonho. Uma atmosfera onírica que pulsa diante de nossos olhos. Talvez este seja enfim o melhor adjetivo para O Grande Gatsby: o filme é pulsante. Vibra em cores, movimentos, som e beleza, como é característico do diretor. Ao recontar a tragédia de Romeu e Julieta anos atrás, o australiano criou uma estética sua, particular recheada de movimento, som e cores. Com Moulin Rouge esta estética cresceu, amadureceu e se tornou espetacular. Gatsby não é espetacular, não no sentido espetáculo em si. Mas é um filme de uma beleza plástica incrível, cada cena parecendo uma pintura, uma foto de anúncio de propaganda de perfume (como aliás ele já fez, para o Chanel No. 5). Claro que a beleza de DiCaprio e a delicadeza, inocência e brilho estampados na cara de uma radiante Carey Mulligan ajudam e muito nesse feito. Mas quem já viu qualquer outro filme de Baz Luhrmann identifica facilmente os seus traços particulares.
Se no início de sua carreira Leonardo DiCaprio era apenas um rostinho bonito, hoje ele é um dos melhores atores do cinema. Em seu filme anterior com Luhrmann (Romeu + Julieta), o ator já demonstrava traços de seu talento. Agora, depois de incríveis interpretações em J. Edgar, Django Livre e A Origem (só para citar alguns) ele encabeça o elenco do drama de Gatsby na pele do personagem título. Outros nomes de peso e de muito talento ajudam a contar a história: Tobey Maguire (da primeira trilogia do Homem Aranha e do subestimado Pleasantville) é o narrador Nick Carraway, tão desconcertado em cena quanto nós na platéia; Joel Edgerton (de A Última Cartada e protagonista de Kinky Boots, filme que deu origem a um musical da Broadway) é seu antagonista Tom Buchanan, o grosseiro e infiel marido de Daisy, amor platônico de Gatsby, interpretada com maestria, doçura e um delicioso ar de tristeza reprimida por Carey Mulligan (de Educação, Shame e Drive). Um dos outros grandes destaques do filme é sua trilha sonora. Embora o verão contado por Carraway seja em 1919, as vozes que ouvimos durante os momentos românticos, dramáticos ou as festas na mansão de Gatsby são bem conhecidas: Jack White, Gotye, Fergie e Will.I.am (do grupo Black Eyed Peas), Florence Welch (Vocalista do Florence and the Machine), Beyonce, Jay Z e  Lana Del Rey, por exemplo. Musicas conhecidas como Let’s Misbehave, Love is Blindness, Crazy in Love, Back to Black e Love is the Drug se juntam a inéditas como o já hino Young and Beautiful, na voz sofrida da já citada Lana Del Rey.
A conclusão a que chegamos é que Baz Luhrmann é um diretor que reinventa clássicos. Reinventou Romeu e Julieta ao transpor a tragédia shakespeareana para os dias atuais mas mantendo o texto original; reinventou os filmes musicais ao fazer regravações e verdadeiros mash-ups de musicas pop num musical passado em 1900. E desta vez reinventa um dos maiores clássicos da literatura americana num filme efervescente e delirante, onde vale muito mais a emoção que a razão.
Aos créditos fica a certeza de que o diretor a cada filme se supera. A cada nova empreitada seus métodos e técnicas se tornam mais refinados e sua beleza maior. Aliando um elenco nada menos que excepcional, um texto ágil, profundo e que por vezes nos dá alguns cutucões e uma trilha que mistura foxtrot, charlestone, rap e dance music, O Grande Gatsby pode até não ter seu mérito reconhecido e não ser aclamado como o melhor filme do ano, mas definitivamente é uma obra prima a ser vista e revista. O retrato de uma pós-juventude vazia e sem pretensões que poderia muito bem ser dos dias atuais e que dissimula este vazio com festas e bebidas. Um sonho construído na tela do cinema.

 

 

13 comentários em “Resenha do blog: O Grande Gatsby

Adicione o seu

Deixe um comentário

Acima ↑